Jardim Público de Évora / Antigo Passeio Público

IPA.00017304
Portugal, Évora, Évora, União das freguesias de Évora (São Mamede, Sé, São Pedro e Santo Antão)
 
Arquitectura recreativa, romântica, revivalista. Jardim romântico, à inglesa. A construção do jardim público, pensado inicialmente enquanto passeio público, prende-se com um aspecto típico da mentalidade oitocentista, a preocupação com o melhoramento e embelezamento das cidades, que se traduziu entre outros aspectos na construção jardins, situação facilmente comprovada pelo grande número de jardins construídos nesta época, particularmente na capital. O arquitecto tomou partido das características topográficos do terreno, acentuando-as com a disposição da vegetação, criando uma série de efeitos de surpresa, através da disposição de uma rede de caminhos de circulação de traçado irregular. Tudo numa busca de tornar o construído o mais próximo possível ao natural, característica primordial dos parques ingleses. A absorção e construção de elementos medievais e neo-medievais complementa o carácter romântico do jardim através da introdução do pitoresco. Apresenta paralelo com o jardim da Estrela em Lisboa (v. PT031106170615), de 1863, do qual tomou o modelo, também no que toca à combinação de um passeio público (com a criação de um eixo de circulação principal), com as características de um jardim à inglesa.
Número IPA Antigo: PT040705210180
 
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Registo

 
Espaço verde  Jardim        

Descrição

Jardim de planta irregular, com desenvolvimento longitudinal de E. para O., acompanhando, nas vertentes S. e SE., o desenho do baluarte da cidade, e delimitado para S. pelas construções existentes. Três entradas principais, reentrantes, formando concavidade, todas com portão de ferro forjado, enquadrado por pilares esquadriados de cantaria de granito, sobrepujados por vasos com plantas. Organiza-se em duas zonas comunicantes e contíguas, mas de características distintas, que não invalidam a existência de um eixo principal que as percorre no sentido do desenvolvimento longitudinal do jardim. A zona E., denominada de Jardim Público, é atravessada sensivelmente ao centro pelo eixo principal do jardim em terra batida, com início no portão E. e com uma largura notoriamente superior à dos restantes caminhos e eixos de circulação, é ladeado por bancos de madeira pintada de vermelho, e em posição de destaque o coreto. A área à esquerda do eixo principal apresenta canteiros de ângulos abaulados, bordejados por valas de drenagem em calçada portuguesa, combinados com caminhos em terra batida. A área é pontuada por bancos em madeira lacada de vermelho que se dispõem entre canteiros e ao longo do muro delimitador do jardim. Apresenta lago de perfil polilobado, definido por muro irregular de calcário. Nesta área concentram-se as unidades de apoio ao público, como o quiosque, em alvenaria, de planta rectangular rematado em coruchéu e revestido a azulejo industrial, o qual é complementado por esplanada; inseridos em placa de terreno pavimentada a calçada portuguesa. Junto ao portão coloca-se a casa do guarda em alvenaria caiada e pintada, de planta quadrangular e cobertura em telhado de quatro águas. A área à direita do caminho principal apresenta canteiros e um lago com o mesmo perfil, apresentando, um número menor de espécies arbóreas. Ambas as áreas dispõem de estatuária, contando-se uma estátua de Vasco da Gama, um busto de Florbela Espanca, dois bustos de carácter alegórico representado a juventude e a velhice, e um busto de Giuseppe Cinatti *1. A massa do Paço manuelino, à direita do caminho principal, marca de forma indelével o jardim e sua leitura, coincidindo com um estreitamento do espaço, que acompanha a estrutura dos baluartes, de tal forma que o caminho principal se inflecte para tornejar o Paço. Este facto reveste a visão das ruínas fingidas de um efeito de surpresa, funcionando como um elemento de transição entre a zona do jardim e a chamada zona da mata. A área de transição entre as duas zonas, é marcada pelo progressivo estreitamento do espaço, devido à estrutura das muralhas da cidade, culminado num único caminho, ladeado por estreitos canteiros arborizados. Nesta zona de transição encontra-se o acesso ao Parque Infantil, situado extramuros nas cavas do baluarte, cujo acesso é feito mediante duas escadarias simétricas de dois lanços, paralelas à muralha, onde se abre vão à face de perfil rectilíneo. A zona da mata apresenta maior densidade vegetal, pautando-se pela presença de espécies autóctones em oposição à grande quantidade de espécies exógenas e exóticas na zona do jardim público. Estas são complementadas pelo aloé vera que, na época de floração, aufere ao jardim um jogo cromático particular. Apresenta duas vias de circulação principais: a que dá continuação ao eixo fundamental do conjunto do jardim, cujo desenvolvimento acompanha a antiga muralha e torreões da cidade, e outra via paralela à muralha exterior do baluarte. Entre estas duas vias estabelecem-se outros caminhos de circulação, de menor largura, que definem também os grandes canteiros, bordejados por valas de drenagem em calçada portuguesa. Retalhando o espaço dos canteiros uma rede secundária de caminhos, pavimentados a lajes irregulares de granito, delimitados por muretes também de granito, funcionando como pequenos taludes. Nos espaços criados por estes caminhos colocam-se bancos de alvenaria revestidos a azulejo azul e branco de motivo ou figura. Sensivelmente ao centro da zona da mata encontra-se o parque de merendas, debaixo da copa de árvores notáveis, com mesas e bancos de cimento. Na zona da mata um caramanchão, de feitura recente, com estrutura de ferro forjado, assente em bases de cimento, com pavimento a lajes de mármore, apresentando ao centro mesa do mesmo material.

Acessos

Rua da República, Largo de São Francisco, Rua do Raimundo

Protecção

Incluído no Centro Histórico da Cidade de Évora (v. PT040705050070) / Parcialmente incluído na Zona Especial de Proteção do Palácio de D. Manuel (v. PT040705210022)

Enquadramento

Urbano, intramuros, inserido na estrutura do Baluarte do Príncipe e do Baluarte do Conde de Lippe (v. PT040705210040), no limite das muralhas da cidade, fronteiro a duas das portas da mesma, a Porta do Rocio e Porta do Raimundo. É delimitado por murete de alvenaria, rematado por friso de cantaria de granito, sobre o qual de dispõe gradeamento em ferro forjado; três entradas principais: para N. comunica com praça fronteira ao conjunto do antigo Convento de São Francisco (v. PT040705210017); para E. com a R. da República, voltando-se o portão para a fachada principal do Palácio Barahona (v. PT040705210149); para O. com a R. do Raimundo. Mantém uma relação harmoniosa com a cidade intramuros, destacando-se também pelo porte das suas espécies arbóreas na imagem da cidade extramuros. A leitura da paisagem extramuros a partir do jardim é prejudicada por uma série de prédios urbanos de fraca concepção arquitectónica, que impedem a utilização do jardim como um miradouro aberto à planície alentejana. Inserido no espaço do jardim encontra-se o Paço de D. Manuel (v. PT040705210022) e panos e torreões da primitiva muralha defensiva da cidade (v. PT040705210040).

Descrição Complementar

CORETO: base de planta hexagonal em cantaria de calcário, bordejada por calçada portuguesa. Pódio com paramentos em cantaria de calcário, sobre embasamento do mesmo material, animado pelo revestimento com painéis de azulejo industrial de padrão e pilastras nos vértices. Sobre o pódio corre gradeamento em ferro forjado e nos ângulos do polígono erguem-se colunas de ferro fundido que suportam a cobertura, ligadas por armação em ferro forjado, formando arcos trilobados, enquadrando a representação de diferentes instrumentos musicais. Cobertura em cúpula de seis panos, de inspiração mourisca, com acrotério no vértice. RUÍNAS FINGIDAS: constituídas por torre quatrocentista, ameada, de secção quadrangular e panos murários perpendiculares e paralelos, em cantaria irregular de granito, de diferente altura, que se adossam a casa contígua e escadaria perpendicular à torre, de três lanços rectos. Integram cinco janelas mudéjares geminadas, com arcos denticulados, retiradas do antigo Paço dos Vimioso, residência do Bispo de Évora, D. Afonso de Portugal. Estas ruínas, propositadamente fingidas, integram-se na lógica do romantismo, no gosto pelo medieval, pela ruína e o pitoresco. Funcionando também como miradouro, o que se enquadra na mesma lógica. PARQUE INFANTIL: apesar de complementar o jardim público no que toca às suas apetências recriativas e lúdicas, não se harmoniza com o carácter romântico do jardim, mas encontrando-se num nível consideravelmente mais baixo do terreno não infere na sua leitura; apresenta caminhos pedonais definidos, com esplanada, equipamentos lúdicos para crianças, lago circular em mármore; incorpora contudo árvores notáveis, cuja plantação é possivelmente contemporânea do jardim. EPIGRAFIA: no busto de Vasco da Gama a inscrição: "Este monumento foi oferecido a Portugal pela província do Natal, África do Sul, para comemorar o 500º aniversário do nascimento de Vasco da Gama, que descobriu aquela província no dia de Natal de 1497"; no busto de Giuseppe Cinatti, a inscrição: "À memória de Giuseppe Cinatti/ Évora Agradecida/ 1884".

Utilização Inicial

Recreativa: jardim

Utilização Actual

Recreativa: jardim

Propriedade

Pública: municipal

Afectação

Sem afectação

Época Construção

Séc. 19

Arquitecto / Construtor / Autor

ARQUITECTO: Giuseppe Cinatti (1863-1870)

Cronologia

1863, Março - deliberação camarária para pedido de autorização ao Ministério da Guerra para demolir a antiga Porta do Rossio e construir nova, com risco do Arquitecto Giuseppe Cinatti; primeira referência em actas camarárias às obras do jardim das Amoreiras, cujo projecto compreendia a sua remodelação e alargamento, em terrenos onde perdurava a memória dos jardins do antigo Paço Real; 1863, 21 Julho - determinação camarária para criar escola nocturna de instrução primária, a instalar nos restos do antigo Paço manuelino em posse de instituição militar; 1863, Setembro - a quando da inauguração do caminho-de-ferro as obras para remodelação do jardim das Amoreiras e Porta do Rossio já se tinham iniciado; 1864, 25 Julho - por decreto governamental são cedidos à edilidade os restos do Paço, o antigo Convento e cerca de São Francisco, ficando a cidade incumbida de num prazo de 3 anos restaurar o paço manuelino e apropriar o convento para instalação de tribunal judicial e aula nocturna de instrução; 1867 - trabalhos de restauro na Galeria das Damas, com obras ligeiras de consolidação e desobstrução das janelas; 1867, Setembro - a obra de Cinatti no jardim já podia ser apreciada, compreendendo a ala manuelina do paço, uma torre arruinada do séc. 16, a qual foi enquadrada no conjunto cenográfico das ruínas fingidas, que integraram um conjunto de janelas de feição mudéjar do séc. 16, retiradas do antigo Palácio dos Vimioso, na sequência das obras de reconstrução de 1863; 1869 - destruída a ala do Paço que estabelecia a ligação à galeria das Damas; 1870 - planos de Cinatti para regular em definitivo o desenvolvimento das intervenções nos edifícios contíguos ao Passeio Público; 1870 - início da segunda fase de construção do passeio público, com a plantação de uma mata nos terrenos do Baluarte do Conde de Lippe, para a qual contribuiu José Maria Eugénio de Almeida com a quantia de 200$000 reis e mil pés de amoreiras do seu parque de Santa Gertrudes; 1884, Agosto - inaugurado busto de bronze de Cinatti, da autoria do escultor Simões de Almeida, no passeio público; 1960 - instalação do Parque Infantil; 1964, 27 Maio - é inaugurado o parque infantil Dr. Almeida Margiochi.

Dados Técnicos

Materiais

Material orgânico: árvores - cedrus atlantica (cedro-do-atlas), magnolia grandiflora (magnólia), taxus baccata (teixo), fraximus angustifolia (freixo), cedrus libani (cedros do Líbano), magnólia tulipeira, schinus molle, phoenix canariensis, casuarina equisetifolia (casuarina), washingtonia, aruacaria heterophylla (araucária), eucapyptus globulus (eucalipto comum), pinus pinea (pinheiro manso), phillynea latifolia (aderno), morus alba (amoreira), olea europea (zambujeiro), vitex agnus-castus (pimenteiro silvestre), jacaranda ovalifolia (jacarandá), punica granatum (romanzeira de jardim), lippia citriodora, platanus hybrida (plátano); arbustos - buxus sempervirens (buxo), viburnum tinus (folhado), strelitzia reginae (estrelícia), lavanula spica (alfazema), aloe vera, cotoneaster pannosa, crataegus monogyna (pilriteiro), ceratonia siliqua (alfarrobeira); herbáceas - chlorophytum, agapanthus, bergenia, hydransea macrophylla (hortênsias), glycine max (glicínia), senecio, gazania splendens. Inertes: calçada portuguesa nas valas de drenagem; madeira pintada nos bancos, alvenaria nos bancos da mata; azulejo no revestimento de bancos; rocha calcária no bordejamento dos lagos e canteiros da mata; ferro forjado em gradeamentos, candeeiros e caramanchão; ferro fundido nos bancos; alvenaria na estrutura do quiosque, casa do guarda, casa-de-banho e muros; cantaria de granito no remate de muros e pilares, janelas das ruínas fingidas; cimento nas mesas e bancos do parque de merendas.

Bibliografia

A.F.B., Roteiro da Cidade de Évora e breve notícia dos seus principaes monumentos, Typographia Minerva, 1881 (2ªed); ALMEIDA, Fialho de, Estâncias d'Arte e de Saudade, Livraria Clássica editora, Lisboa, 1921, pp. 169-172; MANOEL, Caetano da Câmara, Atravez da Cidade de Évora ou apontamentos sobre a cidade de Évora e seus monumentos, Minerva Comercial Lda. Edições, Évora, 1935 (6ª ed), pp. 61-65; ESPANCA, Túlio, Inventário Artístico de Portugal, Concelho de Évora, Academia Nacional de Belas Artes, Lisboa, 1966; DIAS, Pedro, Arquitectura Mudéjar Portuguesa: Tentativa de sistematização, Mare Liberum, nº 8, Dezembro de 1994; LEAL, Joana da Cunha, Giuseppe Cinatti (1808-1879), Percurso e Obra (dissertação de mestrado em história da arte contemporânea), Universidade Nova de Lisboa, Lisboa, 1996.

Documentação Gráfica

Documentação Fotográfica

IHRU: DGEMN / DSID

Documentação Administrativa

Arquivo Distrital de Évora: Livros das Actas da Câmara Municipal de Évora, nº66 a 73, 1854-1872

Intervenção Realizada

Observações

*1 - Em descrições da época nota-se o apreço que a população eborense e os visitantes demonstravam por Cinatti e o seu trabalho: "Fica no topo do terreno das feiras, à entrada da cidade do lado da estação (...) e circunscripto por um grande lanço da antiga muralha, pelo terreiro jacente a S. Francisco, e pela rua onde está o palacete Ramalho (...). É vasto e plantado pelo systema do jardim da Estrella, macissos entremeados de ruasinhas desymetricamente coleantes, que vão e vêem sobre as ramadas do arvoredo. Dentro do arco dos muros ficam umas ruínas de palácio gothico fingidas por Cinatti". (ALMEIDA, 1921). "Entrando na porta do Rocio, prende naturalmente as atenções ao forasteiro o passeio desta cidade. Surprehende, em verdade, aquela esplêndida vegetação; aquella variedade de flores mimosas, aquelles hymnos mysteriosos de rouxinoes, conjunto ao modo de ameno oásis nestas planícies (...) Erguendo-se, tisnado pelo hálito soa séculos, o palácio de D. Manuel com suas janellas geminadas entre verdura e flores, é de um admirável efeito (...) Ao pôr do sol são de um mágico e delicioso agradar as ruínas fingidas com lindíssimas janellas, portadas e columnas manuelinas, que pertenceram aos paços do bispo d'Évora, D. Afonso de Portugal, que transformados em moderna habitação ainda existem defronte da Sé. Aquellas ruínas são filhas do poético e talentoso artista Cinatti" (A.F.B., 1881).

Autor e Data

Inês Pais 2006

Actualização

 
 
 
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