Monumentos 09: Mosteiro da Serra do Pilar, Vila Nova de Gaia
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Dossiê: Mosteiro da Serra do Pilar, Vila Nova de Gaia
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Setembro 1998, 24x32cm, 128 pp. (<2Kg.)
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Uma “civitas dei” em Quebrantões ou a cerca do mosteiro
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Susana Matos Abreu
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A par da sua invulgaridade arquitetónica, a definição urbana do Mosteiro da Serra do Pilar, fundado em 1538, é de reconhecida qualidade. Contudo, ela tanto é incontestada como o seu conhecimento objetivo é escasso. A sua leitura está dependente de um conjunto vasto de fatores perdidos com o tempo, como o desmembramento dos seus edifícios por entidades diferentes, a dissolução da cerca monástica ou a densificação do tecido urbano envolvente. Outros fatores, de caráter simbólico, extinguiram-se a par da casa religiosa, em 1834. Assim, pretendeu-se que algumas memórias, uma vez reavivadas, conduzissem à sua melhor compreensão e tivessem ainda algum valor operativo, permitindo intervir nos planos arquitetónico e urbano sem perda de identidade ou alienação dos valores culturais que persiste em transmitir.
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O Mosteiro do Salvador: um projeto do século XVI
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Marta M. Peters Arriscado de Oliveira
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O mosteiro dedicado a São Salvador é implantado, em 1538, no monte de Quebrantões, em afirmação da visibilidade e proeminência da Ordem de Santo Agostinho, quer no plano eclesiástico, quer no plano da cidade. A Oriente, domina a intersecção das rotas terrestre e fluvial e o espaço urbano, axializando ainda a entrada fluvial. Existem referências comuns de desenho para as obras renascentistas de São João da Foz e do convento. A igreja incorpora, numa perspetiva cristológica de Salvação, o centro para que convergem no espaço uma multiplicidade de devoções locais de prevalência mariana. Para a ideia de síntese concorrem proposições reformadoras, o pensamento e a obra de Francisco de Holanda e de Frei Heitor Pinto. Dentro da igreja os painéis dedicados ao Salvador, um sepulcro e uma arca, sugerem a centralidade e circularidade de um espaço à semelhança do Santo Sepulcro.
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O Mosteiro de São Salvador da Serra como “imago mundi”
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Fernanda Alcântara e João Pedro Xavier
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Considerando a geometria como metalinguagem, foi examinado um possível traçado do Mosteiro de São Salvador da Serra à luz do pensamento renascentista vivido na corte de D. João III e filiado nas raízes pitagóricas, platónicas e hermetistas da filosofia de Santo Agostinho. Na primeira parte estabeleceu-se o paralelo entre o significado dos números e das formas deste traçado basilar, com o simbolismo que a cerimónia da colocação da primeira pedra encerra; na segunda parte analisou-se a persistência da estrutura geométrica ao longo do atribulado e moroso decurso da obra, confrontando a linguagem plástica e os processos construtivos com os conhecimentos expressos nos tratados vigentes, e determinando analogias com modelos nacionais e internacionais. Tendo-se verificado uma coerência em todo este processo, concluiu-se que Frei Brás teria sido o mentor da edificação do Mosteiro de São Salvador da Serra como imago mundi e que Diogo de Castilho e João de Ruão souberam magistralmente traduzir, através do desenho, essa ideia-base.
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A edificação da dupla-rotunda do Mosteiro de Santo Agostinho
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Carlos Ruão
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O Mosteiro de Santo Agostinho da Serra é um edifício paradigmático no que toca ao estudo da história da arquitetura antiga e aos problemas que esta carrega. Documentando-se um projeto primitivo ligado à Renascença Coimbrã, do qual não se sabe muito bem até que ponto foi edificado, a totalidade da obra atualmente erguida foi construída posteriormente e numa linguagem diferente. Quer o claustro, quer a igreja são duas obras típicas do maneirismo noroestino de raiz italo-flamenga. Para além das muitas dúvidas e equívocos que a parca documentação comporta, e apesar da suposta fidelidade ou não a uma planimetria anterior, este é essencialmente um problema de autoria.
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O novo coro da Igreja do Mosteiro de Santo Agostinho da Serra e a deslocação do claustro (1690-1691)
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Joaquim Jaime B. Ferreira-Alves
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O Mosteiro de Santo Agostinho da Serra levantado defronte do Porto, no século XVI, apresenta na sua igreja e claustro a originalidade de uma dupla planta centrada circular. Em finais do século XVII, uma obra importante iria alterar a sua estrutura primitiva: um novo coro (1690-91), cujo projeto se deve ao arquiteto Domingos Lopes, levou à demolição do claustro e à sua reconstrução no local onde hoje se encontra, trabalho executado pelo mestre-pedreiro do Porto, Manuel do Couto, o responsável, em parceria com João da Maia. Seria após a sua reconstrução, que manteve a sua estrutura inicial, que o claustro receberia o magnífico coroamento datado de 1692.
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Em torno da talha da igreja
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Natália Marinho Ferreira-Alves
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O interior da igreja do Mosteiro da Serra do Pilar não corresponde, de forma alguma, à visão magnífica que teve outrora. Porém, os retábulos e os púlpitos que ainda subsistem, e em particular os elementos pormenorizados que a documentação chegada até aos nossos dias nos relata, permitem-nos fazer uma ideia aproximada da qualidade excecional da talha da igreja, sua inserção na estrutura arquitetónica e sequente diálogo entre as duas realidades estéticas complementares.
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A fortaleza do convento
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Francisco Sousa Lobo
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A fortaleza da Serra do Pilar situa-se na margem esquerda do Douro, à cota 85 metros, tendo um ligeiro comandamento no sentido noroeste, sobre os terrenos da margem oposta. Essa posição de observação não era importante sob o ponto de vista militar, até que o desenvolvimento da artilharia permitiu atingir a cidade do Porto, a partir de Gaia. Durante o Cerco do Porto, em 1832, foi reconhecido o valor militar do local, que constituiu um reduto dos liberais. Sustentaram a posição isolada na margem oposta à cidade que eles ocupavam, transformando o convento em improvisada fortaleza. Essa nova função marcou de tal forma o local que, mesmo depois de terminada a guerra civil, foi reforçado o sistema fortificado. Foi difícil compatibilizar a nova função militar com os interesses da comissão da igreja, processo que se arrastou ao longo do século XIX. No início do século XX, a fortaleza do convento tornou-se quartel e a igreja passou a ter acesso livre.
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Quando cortaram a Serra do Pilar
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Domingos Tavares
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A construção da Ponte D. Luís I alterou a relação visual da Igreja e Mosteiro da Serra do Pilar com o Porto e o seu rio. O cenário percetível das zonas ribeirinhas ganhou um filtro separador que distanciou psicologicamente a outra margem e o monumento. É como se a ponte, que liga funcionalmente as duas margens, pusesse em destaque um facto, hoje evidente: são margens opostas. E como se não bastasse, rompeu-se o monte. A inserção da vala para construção da avenida descarnou a rocha numa ferida abrupta e ainda mais distanciou a igreja lá no alto. A quadrícula do contraforte de sustentação do largo-miradouro constitui um sinal da violência justaposto à ponte metálica, que racionaliza o sentimento de distância e a noção de parede, isolando o conjunto monumental da vivência serena dos casarios mais próximos. O desenho em rede, ou quadrícula, referencia-nos à abstração das formas, isolando-as do natural, o que, neste caso, implica esse sentimento de separação e distância.
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Ponte sobre o rio Douro, entre Fontainhas (Porto) e a serra do Pilar (Vila Nova de Gaia)
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Adalberto Dias
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É gesto ousado a construção de uma nova ponte sobre o Douro entre as Fontainhas e a Serra do Pilar, não só pelo motivo que o origina (fecho do tabuleiro superior da Ponte D. Luís I para passagem do metro ligeiro de superfície), como ainda pelo impacto e transformação que provoca na paisagem urbana envolvente. O conceito formal para esta travessia segue o raciocínio simples e inteligível de aplicação dos princípios e regras da estática à realidade e especificidade dos dois territórios a unir. É uma ponte com uma viga-caixão contínua, em dois vãos desiguais a que corresponderão um apoio principal na margem esquerda do leito do rio e duas amarrações, cada uma em sua margem, e um viaduto de aproximação para a sua inserção urbana no Porto, de forma a viabilizar a percurso da Alameda das Fontainhas.
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Conservação do património azulejar: problema da remoção de azulejos
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M. Malhoa Gomes
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Os revestimentos azulejares, que, em larga escala, decoram espaços e edifícios ao longo de todo o país, constituem uma das maiores expressões da cultura portuguesa. No entanto, o grande número de azulejos em revestimentos arquitetónicos, aliado ao seu significado no início do século passado, fez com que se tivessem removido, de forma mais ou menos indiferenciada, alguns revestimentos azulejares, justificando-se esta ação pelo seu estado de degradação ou pela necessidade de tratar as paredes de suporte. A maioria destas remoções foi efetuada sem registo, e como reflexo das mesmas constataram-se as seguintes situações: recolocação de azulejos em sítios com características diferentes das originais; assentamento inadequado dos azulejos; não recolocação dos azulejos e/ou armazenamento dos mesmos em más condições. A “coleção” encontrada numa das salas contíguas ao altar-mor da Igreja e Mosteiro da Serra do Pilar — fragmentos e azulejos das mais variadas épocas, dos séculos XV-XVI até aos nossos dias — constituía, antes da empreitada de conservação, um elucidativo exemplo deste último caso.
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Intervenções da Direção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais
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Paula Araújo da Silva
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A DGEMN promove obras de restauro no Mosteiro de Santa Maria do Pilar desde 1927. A intervenção, aqui apresentada, tem por objetivo a conservação e valorização generalizada do imóvel e inclui, entre outros: a limpeza e pintura exterior do monumento, bem como a sua iluminação exterior; o reordenamento da área envolvente do mosteiro; a reorganização dos espaços adjacentes à igreja e ao claustro com vista à sua musealização, projeto que visa, essencialmente, a criação de um percurso arquitetónico desde a capela velha ao claustro.
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Da árvore ao museu: um caso curioso em Óbidos
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José Fernando Canas
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A igreja da Misericórdia de Óbidos, templo de nave única, quase integralmente revestida com belíssimos painéis de azulejos seiscentistas, situa-se paredes-meias com o edifício que serve, desde há décadas, de sede do museu municipal. Em 1996, foi a DGEMN alertada pela Santa Casa da Misericórdia de Óbidos para o facto de várias fiadas de azulejos se terem descolado do suporte. Todavia, e após esses azulejos terem sido cuidadosamente retirados, constatou-se um fenómeno jamais observado em situações deste tipo: as raízes dos plátanos do terreiro adjacente tinham-se desenvolvido horizontalmente e atravessado as alvenarias tradicionais da parede da igreja, provocando o destacamento da azulejaria. Tomou-se a decisão de desaterrar uma área do terreiro (Largo de Santa Maria) contígua aos dois edifícios, de modo a construir-se uma parede subterrânea em betão, barreira eficaz contra o avanço daquelas raízes. Propôs então a Câmara Municipal de Óbidos que, tirando partido dessa escavação, se construísse uma sala subterrânea à cota do piso intermédio do museu, dada a evidente falta de espaço expositivo.
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Os azulejos do Mosteiro de Paderne: um revestimento integrado num monumento românico
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Luís de Magalhães Fernandes Pinto
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O Mosteiro do Divino Salvador de Paderne é um monumento românico do século XII, situado a alguns quilómetros de Melgaço. É de notar o revestimento azulejar de grande qualidade, aplicado na parede de entrada de uma capela absidal, que surpreende pelo facto de ser um revestimento do século XVII in situ, com elevada qualidade material e conceptual. Uma solução de ordem decorativa tão meditada para a entrada de uma capela secundária pode significar que ali havia uma arreigada tradição litúrgica, quando os Cónegos Regrantes a receberam. Para a manterem, aqueles clérigos tê-la-iam valorizado através do culto do Santíssimo e redecorado com um material que muito apreciavam: o azulejo.
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A recuperação do edifício dos Paços do Concelho de Lisboa
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Francisco da Silva Dias
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Após o incêndio que, em 7 de novembro de 1996, destruiu grande parte do edifício dos Paços do Concelho de Lisboa iniciou-se a sua reconstrução com base nos seguintes pressupostos de ordem política, cultural e técnica: o edifício deveria destinar-se aos órgãos representativos do município, devendo ainda ser aberto à população e ser suporte de arte pública; todas as zonas do edifício atingidas pelo incêndio que permitissem ações de restauro deveriam ser intervencionadas de acordo com a época em que foram executadas; todas as zonas do edifício deveriam ser projetadas segundo um desenho atual, incluindo o mobiliário e o equipamento.
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Capela tumular de Garcia de Resende na cerca do Convento do Espinheiro, Évora
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José Filipe P. P. Cardoso Ramalho
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A capela tumular do poeta e cronista Garcia de Resende, um edifício de características miniaturais de sensibilidade mudéjar do tardo-gótico alentejano, foi construída em 1520, na cerca do Convento de Santa Maria do Espinheiro, em Évora, sendo a sua traça atribuída ao mestre Martim Lourenço. A extinção do convento em 1834 motivou a ruína da capela, que deixou de ter prática litúrgica. Encontrando-se a capela num estado de degradação generalizada, em grande parte fruto da situação de abandono, promoveu-se o controlo e saneamento das patologias e deficiências detetadas, garantindo as condições de estabilidade, salubridade e dignidade do imóvel.
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